Brasília, 20 de abril de 2012 - 12:29
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Quarta-feira, 18 de abril de 2012
Decreto questionado na ADI dos quilombolas é defendido por interessados na tribuna do STF
Admitidas na condição de amici curiae (amigos da Corte) na análise da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3239, algumas instituições participaram do julgamento manifestando-se da tribuna do Supremo Tribunal Federal (STF) de forma favorável à manutenção do Decreto nº 4.887/2003. Esta norma, questionada na ação pelo atual DEM, regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos.
CNBB
A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), representada pelo advogado Torquato Jardim, foi uma das instituições que defenderam o decreto. Coube a ele tratar apenas dos pressupostos processuais, tendo em vista a divisão de cada ponto a ser abordado pelos amigos da Corte.
O representante da CNBB levantou quatro preliminares de não conhecimento da ação. Quanto à primeira, sustentou que se a Corte declarar a inconstitucionalidade do Decreto nº 4.887/2003, um decreto anterior, de 2001, que dispõe sobre o mesmo assunto, volta a ter validade. “Pede-se a revogação do decreto de 2003, mas não se pede e se silencia sobre o decreto de 2001”, disse, ao ressaltar que, “na forma da jurisprudência, se se decreta a inconstitucionalidade do decreto de 2003, represtinados ficam os efeitos do decreto 2001, que regulamentava a mesmíssima matéria”. Ele citou como precedentes, as ADIS 2215 e 2574.
A segunda preliminar, conforme Torquato Jardim, refere-se ao fato de que não cabe impugnação genérica sem conteúdo jurídico substantivo e sem indicação precisa das normas constitucionais violadas. Nesse sentido, as ADIs 2111, 1775, 2174 e 1708. Quanto à terceira preliminar, alegou que o Decreto 4.887 é ato normativo apenas formal, “uma vez que em face do seu conteúdo é um ato político administrativo de efeito concreto, sendo pois insuscetível de sofrer controle de constitucionalidade pela via abstrata e concentrada”. Ele lembrou as ADIs 647, 842 e 710.
Em seguida, em relação à quarta e última preliminar, o advogado salientou que se houver ofensa à Constituição, será reflexa. Ele afirmou que o decreto questionado deriva de leis (Lei 7.668/88 que cria a Fundação Palmares; Lei 9.649 de competência do Ministério da Cultura e a Lei 9.784/99) e atos internacionais. “Na verdade, o decreto revogado de 2001 tinha a motivação mais clara, mais precisa, porque fazia menção expressa às Leis 7.668 e 9.649”, disse.
Estado do Paraná
Em nome do Estado do Paraná, falou o procurador do Estado Carlos Frederico Maré de Souza Filho, que considerou importante a manutenção do decreto questionado para a continuidade das políticas públicas no estado. “Seria engraçado, se não fosse trágico, dizer que são necessários lei, decreto ou qualquer outro ato para regulamentar o direito do quilombola”, ressaltou, frisando que esse direito está previsto pelo artigo 68, da Constituição Federal.
“O Brasil foi o último país das Américas a libertar os escravos. A escravidão se manteve no Brasil durante o século XIX por falta de lei que regulamentasse uma Constituição [de 1824] que garantia a liberdade”, lembrou. Segundo ele, os quilombolas têm, na terra, o fundamento de suas vidas. “Para eles, a terra não é propriedade, é muito mais, é um conceito anterior ao conceito da propriedade privada”, completou.
Carlos Frederico contou a experiência concreta de seu estado quanto à questão quilombola. “O Estado do Paraná – polonês, ucraniano, alemão, italiano, fundamentalmente branco – reconheceu a existência de seus negros e de seus quilombos e passou a ter políticas públicas a partir do momento em que esse decreto pode facilitar as formas do desenvolvimento”, destacou. Conforme ele, as políticas públicas do Estado do Paraná foram feitas não por uma política de governo, mas por uma política de estado, tendo em vista que na mudança de governo, mesmo com a entrada da oposição, essas políticas foram mantidas.
Associações quilombolas
“A decisão paradigmática do STF poderá concluir novos futuros de passados que foram negados, de presentes que estão sendo debatidos nesse espaço hoje”, afirmou Eduardo Fernandes de Araújo, que representou a Associação dos Quilombos Unidos do Barros Preto e Indaiá e Associação de Moradores Quilombolas de Santa, Coordenação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas de Mato Grosso do Sul. Ele salientou que este julgamento, pelo Supremo, é emblemático não só pela política de titulação e demarcação de terras, mas em relação ao direito comparado, porque “irá repercutir nas comunidades quilombolas que existem em toda a América Latina, advindas de um processo histórico de escravidão”.
Eduardo de Araújo se manifestou, em nome das associações, pela improcedência da ação direta. “Demoramos 25 séculos para construir uma ideia de declaração universal de direitos humanos. Com esse silêncio normativo, que ocorre com a possibilidade de inconstitucionalidade do decreto, quantos séculos, quantos anos teremos para demarcar e titularizar essas áreas quilombolas?”, indagou, ressaltando que a medida é urgente porque “os direitos humanos devem ser postos em prática neste instante”.
Outras instituições
Pelo Instituto de Advocacia Racial e Ambiental e Clube Palmares de Volta Redonda, falou Humberto Adami Santos Júnior. De acordo com ele, a constitucionalidade do Decreto 4.887/2003 deve ser declarada. “O Brasil tem uma dívida a saldar por conta da escravidão e dos resquícios que persistem até hoje na propriedade da terra, na universidade, no conhecimento”, disse.
Da tribuna do Supremo, Humberto Júnior salientou que “inconstitucional é não cumprir a Constituição, o decreto está cumprindo a Constituição, está buscando os termos de que falam os vários artigos já citados aqui”. “Se no julgamento de hoje ocorrer a procedência da ADI, uma avalanche de ações de reintegração de posse poderá ser iniciada pelo país”, avaliou.
EC/CG
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