terça-feira, 11 de agosto de 2009

MEU AMIGO AGUINAGA

Conheço Hugo Studart desde os tempos do jardim de infância. Ambos fomos colegas no Colégio Nossa Senhora de Fátima, em Brasília, no pré-primário. Depois, fomos colegas de judô por oito anos. Mais à frente, já na Unb, fomos colegas de redação, editoria e criação de um "must candango", o jornal alternativo "Navégus, Caras Novas nas caras velhas", hoje cult da Brasília dos anos 80. Hugo, a quem apelidei há decádas de "Aguinaga", sempre esteve metido em uma boa polêmica. Como jornalista, tem boas e notáveis histórias. Cito, apenas algumas. Quase foi demitido da Folha ao perguntar ao então Ministro das Comunicações, Antonio Carlos Magalhães, o que achava das denúncias de corrupção que a oposição fazia. Como repórter da Isto É, descobriu que o Itamaraty tinha apenas 6 embaixadores afrodescendentes, de um total de 1200 diplomatas. A reportagem propiciou o contato com o proprietário da Editora Três, Domingos Alzugaray, que controla as revistas Isto É, e que motivou um contato com a Afrobrás, mantenedora da Universidade Zumbi dos Palmares. Aguinaga sempre esteve muito presente em sua área. Vejo, pois com muita dificuldade essa decisão de excluí-lo da pesquisa, exigindo a revelação de suas fontes como jornalista. È como se exigisse a revelação pelos jornalistas, do segredo do "garganta profunda" do caso do impeachment do Presidente norte-americano Richard Nixon, o que só ocorreu quando este completou mais de 90 anos de idade. Espero que o assunto possa ser revisto e a decisão não repita os equívocos dos tempos de Copérnico.

Humberto Adami

A GESTAPO-GOUCHE E OS DESAPARECIDOS DO ARAGUAIA por Hugo Studart

A esquerda brasileira produziu grandes ícones, como os comandantes Luis Carlos Prestes e Maurício Grabois. Teve pensadores da estirpe de sss, que por sinal era general, e abnegados, como o médico João Carlos Haas Sobrinho. Forjou homens de imensa coragem pessoal, alguns ainda militando, como César Queiroz Benjamin e Fernando Gabeira. Há ainda uma legião imensa de idealistas anônimos, como minha avó materna, que enviou seu primogênito à guerra a fim de lutar contra os nazistas. Goste-se ou não desses nomes, concorde-se ou não com seus ideais, temos que admirá-los. Afinal, arriscaram suas vidas por uma causa maior. A mesma esquerda, contudo, produziu uma legião de arrivistas, farsantes, argentários, elementos da piores escolas das trevas, a KGB de Beria e a Gestapo de Himmler. Gentinha que comete execuções sumárias, sem direito à defesa, sem julgamento, por vezes sem direito sequer a tomar conhecimento da acusação.

Foi Hannah Arendt que ousou juntá-los no mesmo saco, no clássico “Origens do Totalitarismo”. Mais tarde, encontrou em Dante o conceito do “Mal Radical”. Até que por fim, em “O Julgamento de Eichman”, ousou tentar entender e explicar o mal que essa gente inconseqüente provoca através do fenômeno da “heteronomia”, no qual burocratas do totalitarismo são acometidos de um “vazio do pensamento”. Não pensam, não elaboram, apenas seguem a onda, inconsequentemente.

Isto posto, venho informar aos amigos que o grupo Tortura Nunca Mais do Rio de Janeiro lançou um manifesto contra minha participação no Grupo de Trabalho que busca os corpos dos desaparecidos da Guerrilha do Araguaia. Fui nomeado para o grupo como Observador Independente, na condição de historiador e pesquisador da Universidade de Brasília. Produzi uma pesquisa para o mestrado em História na UnB, que se transformou no livro “A Lei da Selva – Estratégias, Imaginário e Discurso dos Militares sobre a Guerrilha do Araguaia”. Agora, no doutorado, pesquiso tema correlato, “Imaginário e cotidiano dos guerrilheiros do Araguaia”. Por essa razão estou no grupo.

Os membros do Tortura Nunca Mais-RJ se dizem “indinados (sic) e perplexos” pelo fato de que, no livro “A Lei da Selva”, eu não delatei explicitamente o nome dos informantes militares. Argumentam que eu teria o dever de entregá-los à polícia. Reclamam também de um artigo que publiquei recentemente na página 2 do jornal “O Estado de S.Paulo”, com o título “A Guerra Acabou”, no qual defendo com vigor o dever do Exército de buscar os corpos dos desaparecidos e entrega-los às famílias. Defendo esse direito sagrado das famílias ao longo de todo o livro. Defendi a mesma idéia em um outro artigo que publiquei no Estadão. E venho defendo também a necessidade de se fazer um acordo com os ex-combatentes militares, pois só eles sabem exatamente onde estão os corpos. Não sou o único Observador Independente no Grupo de Trabalho. Há também o ex-deputado Aldo Arantes, do Comitê Central do PC do B. Curiosamente, Aldo defende a mesma idéia. Nós dois, cada um a seu modo, registramos em ata a necessidade de o Exército criar canais de comunicação informal com os ex-combatentes para que possam relatar o que sabem, resguardado o sigilo da fonte. O essencial, acredito, é entregar os corpos para as famílias. Meus pontos de vista são claros, explícitos, apresentados à luz do dia, em artigos assinados e com fotografia no alto.

Ora, mas o Grupo Tortura Nunca Mais-RJ queixa-se do fato de eu ter optado por preservar a identidade das fontes histórias. O artigo 5 da nossa Constituição sagra o direito (e o dever) de se preservar o sigilo das fontes de informação. Ora, ora, ora, o mais importante é que sou um historiador, não um delator. Meu dever acadêmico é relatar e interpretar os objetos históricos, não as pessoas. Há mais de um século, desde Weber, a ciência foi segmentada da militância política. Pesquisador é pesquisador, militante político é outra coisa. Ademais, não sou policial para ficar apontando culpados e inocentes. Não sou patrulheiro ideológico. Nunca gostei de polícias políticas. Tenho mais afinidades com libertários idealistas como Tolstoi do que com “formuladores” pragmáticos como Stalin. Definitivamente: não sou membro da KGB nem da Gestapo.

Meu diálogo não é com Himmler ou com Beria, como quer parte do Grupo Tortura Nunca Mais-RJ, mas com Hannah Arendt e os autores da História Cultural e dos estudos do Imaginário, como Chartier, Bhabha, Baczko, Bordieu e, principalmente, Castoriadis. Vale esclarecer que os estudos do Imaginário têm por objetivo terminar com os maniqueísmos, binarismos, dicotomias e baboseiras afins nas análises da História. Parece que, em pleno século XXI, restam mentes binárias na esquerda pátria. Elementos tomados de um “vazio do pensamento”, como diria Arendt.

Na longa lista que subscreve o manifesto, parece que há pessoas dignas de respeito. Há inclusive uma militante que me ajudou muito a escrever a “Lei da Selva”, ajudou mais do que a maior parte dos militares, tendo inclusive acesso a quase todos meus documentos (exceto o nome das fontes). É Criméia Almeida, ex-guerrilheira, a quem sempre tratei com o maior respeito. Acredito, portanto, que a grande maioria (talvez a quase totalidade) dos signatários tenha caído no conto-do-vigário, escorregado no oba-oba, alguém que disse “assina aqui” e – pronto! – o mal está feito. Então um grupo de inocentes-úteis divulga uma peça difamatória, um crime, o Mal Radical, uma execução sumária, sem direito sequer a julgamento. Mas acuso quem escreveu a inicial do manifesto de farsante! Fraudulento! O autor escondeu-se no anonimato da coletividade. É um covarde!

Aluno exemplar egresso da escola de Goebbles, esse fascista, o autor da inicial, pinçou meias-verdades para construir uma grande mentira. Faço questão de conhecer sua identidade. Qualquer um que tenha lido “A Lei da Selva” sabe, por exemplo, que revelei vários fatos inéditos sobre a guerrilha do Araguaia que deixaram os militares enfurecidos, cheguei a correr perigo de vida. Mas fiz as revelações em diálogo com os pensadores da História da estirpe de Castoriadis, e sem concessões à Gestapo. Eis algumas revelações históricas inéditas:

1 – Que o Exército executou pelo menos 25 prisioneiros 2 – A existência da Terceira Campanha, quando o Exército desceu na selva com trajes civis, identidades falsas e a ordem expressa de não fazer prisioneiros: 3 - Que foram os generais Médici e Orlando Geisel quem deram a ordem de não fazer prisioneiros; e que Ernesto Geise ratificou e seguiu à risca: 4 – Os nomes, sobrenomes e patentes de todos os comandantes da Primeira Campanha, da Segunda Campanha, da Operação Sucuri e da Terceira Campanha. Está no livro inclusive o nome dos comandantes que ainda estão vivos: 5 – O destino provável de cada guerrilheiros, quem morreu lutando, quem foi executado depois de preso, quem foi decapitado, etc. Revelei inclusive 18 mortos a mais do que o PC do B sabia; 6 - A localização provável de vários corpos. Inclusive a existência de um cemitério clandestino ao lado da pista de pouso da base militar de Bacaba. Aliás, o Grupo de Trabalho vai escavar a pista de pouso esta semana, acredito, a partir dessas dicas. Vale lembrar que todo o meu trabalho, que deixa o Grupo Tortura Nunca Mais –RJ indignado e perplexo, é para relatar e interpretar como foi que o Exército abandonou as Leis da Guerra e as convenções de Genebra para instaurar a Lei da Selva. Daí vem o título.

Questiono de onde viria minha obrigação de delatar as fontes. Em seus respectivos livros, Elio Gaspari preserva as fontes. Jacob Gorender, do PCB, preserva as fontes. O professor Romualdo Pessoa, que antes de mim fez um excelente trabalho sobre os camponeses do Araguaia, idem. Romualdo sequer cita os apelidos das fontes; eu ainda cito os codinomes e os nomes de todos os comandantes. Em a Lei da Selva, trato a questão das fontes da seguinte forma:

Pouco antes de morrer, o sociólogo Herbet de Souza, o Betinho, esteve diante do mesmo dilema. Ex-dirigente do grupo guerrilheiro Ação Popular (AP), Herbet de Souza prestou depoimento para um livro do jornalista Geneton Morais Neto sobre episódios ocorridos durante o regime militar. Falava a respeito do atentado ao Aeroporto de Guararapes, Recife, em 1966, apontado como marco inicial da luta armada no Brasil. O alvo da bomba era o general Costa e Silva, mas atingiu outro militar e um jornalista que nada tinha a ver com os fatos, matando os dois e ferindo outras 17 pessoas. Trata-se de um dos episódios mais polêmicos da luta armada brasileira. Caso tivessem matado Costa e Silva, seus autores teriam revirado a história. Como fracassou e resultou na prisão de 600 comunistas e na morte de outros 20, até a presente data ninguém assumiu a paternidade do ato. Em seu depoimento, Herbet de Souza revela que o atentado teria sido praticado por dois militantes da Ação Popular e que conhecia a identidade deles. Diante da insistência do pesquisador para que revelasse os nomes, usou o seguinte argumento:

“Há o problema das famílias. O que acontece é que estas histórias nunca terminam totalmente. (...). Acho que não se deve dizer os nomes. Não vai mudar nada. (...). É uma dessas histórias que devem ser enterradas. O que a gente tem de fazer é tirar as lições. Isso sim.”

“Curiosamente, Betinho usou argumento idêntico ao dos militares para ocultar a identidade dos que, entre eles, cometeram crimes de morte. Bobbio nos lembra que um dos princípios fundamentais do Estado constitucional é que “o caráter público é a regra, o segredo, a exceção”. Kant, por sua vez, afirmou resolutamente que o Iluminismo exige “a mais inofensiva de todas as liberdades, qual seja, a de fazer uso público da própria razão em todos os campos”. Diante disso, tomei a decisão de relatar e analisar aqueles episódios mais obscuros rememorados por militares nas entrevistas orais. Contudo, optei também por manter o compromisso de não tornar públicas as identidades daqueles que cometeram atos de exceção”.

É exatamente esse trecho a razão da celeuma. A transcrição do trecho inteiro é a prova cabal de que o autor do manifesto abaixo é um farsante, um escroque. Termino transmitindo na íntegra o manifesto da Gestapo da esquerda. E solicitando, encarecidamente, que o fascista-autor dessa farsa se apresente para debater comigo de peito aberto, sem se esconder na coletividade de militantes amigos, muitos deles respeitáveis e íntegros. E aos demais, peço que tenham mais cuidado antes de assinar bobagens desse Groucho Gauche.

Hugo Studart

Grupo Tortura Nunca Mais-RJ

Farsa Histórica?

Indinados e perplexos, tomamos conhecimento da participação do Sr. Carlos Hugo Studart Corrêa como Observador Independente do Comitê Interinstitucional de Supervisão das atividades do Grupo de Trabalho criado pelo Ministério da Defesa, que busca localizar e identificar os corpos dos guerrilheiros na região do Araguaia. Surpreendentemente, seu nome foi indicado como pesquisador pela Universidade de Brasília – UNB, por decreto do Ministro da Defesa publicado no Diário Oficial da União, nº 131, de 13 de julho de 2009. Neste mesmo decreto, consta como Comandante da Equipe de Apoio Logístico, o General de Brigada, Mário Lúcio Alves de Araújo, comandante do 23º Batalhão de Infantaria de Selva que, como já assinalado em nota anterior, em entrevista ao jornal "O Norte de Minas", publicada em 31 de março de 2008, declarou "(...) há exatos 44 anos o Exército brasileiro atendendo a um clamor popular foi às ruas contribuindo substancialmente e de maneira positiva, impedindo que o Brasil se tornasse um país comunista". No que se refere ao Sr. Hugo Studart, nossa surpresa se prende ao fato de que em seu livro “A Lei da Selva” (Geração Editorial, 2006) – produto de sua dissertação de mestrado defendida em 2005, na UNB – deixa claro o acordo que fez para manter o anonimato dos militares que participaram diretamente dos crimes cometidos na região do Araguaia contra os guerrilheiros e a população local. Afirma ele: “A condição exigida, respeitada, implicou citar os militares colaboradores por codinomes” (p. 23, nota de rodapé 43). Além disso, informa que teve acesso a “documentos oficiais das Forças Armadas” como “mapas, relatórios de ações, ordens de batalha” (p.23), assim como o que chamou de Dossiê Araguaia “elaborado por militares entre 1998 e 2001” (p.23). Este Dossiê teve como coordenador geral um coronel “hoje na reserva, que doravante conheceremos pela identidade fictícia de George Costa, o Dr. George, codinome que de fato usava durante a Guerrilha do Araguaia” (p.31). É importante assinalar que os familiares e as entidades de direitos humanos jamais tiveram acesso a esses documentos, apesar da luta de mais de 20 anos pela abertura ampla, geral e irrestrita dos arquivos da ditadura. Indagamos se esse tipo de pesquisa histórica contribui para a sociedade brasileira conhecer criticamente parte de sua história recente. A nosso ver, tal trabalho continua mantendo na obscuridade e nas sombras os responsáveis pelos crimes contra a humanidade cometidos em nome da segurança nacional. Fortalece, também, a idéia de que “o ponto essencial é desvendar o destino dos mortos e desaparecidos” (p.19), o que vai de encontro com a atual proposta governamental através da formação do Grupo de Trabalho e do Comitê de Supervisão. Entendemos que a história não pode se resumir apenas à entrega dos restos mortais de todos os opositores políticos da ditadura civil-militar. É fundamental que possamos conhecer o que aconteceu, como aconteceu, quando aconteceu, onde aconteceu e quais os responsáveis pelas atrocidades cometidas pelo Estado terrorista implantado, em nosso país, em 1964. Outra questão refere-se ao fato de que o Sr. Studart ao afirmar ter conhecimento de documentos e informações ainda hoje secretos, relata acontecimentos que nunca estiveram presentes nos depoimentos colhidos pelas várias caravanas de familiares e pelo Ministério Público Federal, em 2001, na região do Araguaia, assim como por diferentes pesquisadores do tema. Em seu artigo “A Guerra Acabou”, publicado no jornal O Estado de São Paulo, em 06/07/09, (p. A2) afirma que “(...) três guerrilheiros que se entregaram, foram poupados e receberam novas identidades: Hélio Navarro de Magalhães, Antônio de Pádua Costa e Luiz René Silva” Em nenhum momento revela as fontes e documentos comprovando tais afirmações. Essa prática de informar sem apresentar as fontes e os documentos ditos secretos está presente em várias reportagens, publicações e depoimentos de militares e colaboradores do aparato de repressão. Em realidade, tem servido para confundir e desinformar, desqualificando a memória e a luta dos opositores políticos. Além disso, submete os familiares e amigos a um “crime continuado”, torturando-os, provocando mais dor e sofrimento. É, ainda, uma tentativa perversa de enfraquecer a militância dos familiares e das entidades de direitos humanos em busca da justiça e da afirmação de outras memórias. Por tudo isto, continuamos reafirmando nossa posição de repúdio ao Grupo de Trabalho e ao Comitê de Supervisão cuja composição e funcionamento não merecem a nossa confiança e o nosso apoio. Exigimos, portanto, a formação de um novo Grupo de Trabalho sob a coordenação da Secretaria Especial de Direitos Humanos, como já proposto em nota anterior. Pela Vida, Pela Paz! Tortura, Nunca Mais!

Rio de Janeiro, 05 de agosto de 2009 Grupo Tortura Nunca Mais do Rio de Janeiro Comitê Catarinense Pró-memória dos Mortos e Desaparecidos Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos CEBRASPO Justiça Global Instituto Helena Greco de Direitos Humanos e Cidadania

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