terça-feira, 28 de abril de 2015

Conferência de Direitos Humanos analisa políticas de igualdade racial

Painel da Conferência de Direitos Humanos analisou políticas de igualdade racial vigentes no Brasil

Conferência de Direitos Humanos analisa políticas de igualdade racial

Belém (PA) – O primeiro painel da VI Conferência Internacional de Direitos Humanos debateu os principais desafios da igualdade racial. O encontro, na tarde desta segunda-feira (27), foi conduzido por Humberto Adami Santos Junior, presidente da Comissão Nacional da Verdade da Escravidão Negra no Brasil, e teve como debatedores Zélia Amador de Deus, Frei David, Nilma Lino Gomes e Wilson Prudente. Jorge Lopes de Faria foi o secretário da mesa. Participaram também o vice-presidente nacional da OAB, Claudio Lamachia e o diretor-tesoureiro da entidade, Antonio Oneildo. 

Fundadora do Centro de Estudos e Defesa do Negro no Pará, Zélia trouxe ao debate a questão das diferenças dentro do conceito e igualdade, além de traçar um histórico da luta do movimento negro por reconhecimento. “A emergência da noção de igualdade como categoria jurídica aparece após as revoluções do final do século 18, como francesa e independência americana. A noção de igualdade que emerge é para dar a todos direito à dignidade e honra. Desde então, todas nações que surgem trazem a igualdade perante a lei”, recobrou.

Zélia contou aos participantes da Conferência que foi apenas após os horrores do Holocausto da Alemanha que é criada a ONU e a declaração dos direitos humanos passa a ser de todos. “Os direitos humanos que surgem em 1948 carecem, no entanto, de que, a fim de que igualdade seja de fato, não fique apenas na formalidade, mas que seja ampliada a ponto de trazer em seu bojo a diferença, de forma que ela passe a ser um dos direitos fundamentais. A igualde que comporta a diferença é a que nos interessa: negros, mulheres, povos indígenas e todos os oprimidos. A que sai do campo da igualdade formal, de todos iguais perante a lei, se amplia e traz ao seu campo a diferença, a possibilidade de construção da igualdade: igualdade na materialidade, substantiva”, clamou.

Segundo a professora, são três os pilares no combate ao racismo e na promoção da igualdade racial. “Na questão da punição, já temos leis que proíbem o racismo. Para a promoção, conseguimos políticas públicas por parte do Estado brasileiro. Temos agora que discutir a questão da reparação no sentido de consolidar propostas”, explicou.

Frei David, da ONG Educafro, elogiou os alunos cotistas pelo desempenho acadêmico alcançado em todos os anos que a medida tem valido no Brasil. “Todas as pesquisas comprovam que a média acadêmica é igual ou superior aos do não cotistas. Temos feito nossa parte na militância, vocês têm garantido o nível acadêmica. Hoje temos quase 95% de todas as instituições de ensino públicas e particulares com programas de inclusão de negros, brancos pobres e indígenas”, disse. Frei David também ressaltou as cotas nos concursos públicos no STF, CNJ, TST e, futuramente, no STJ.

O ativista lembrou as ações da OAB em prol da população negra do Brasil, como a defesa das cotas raciais no STF e a recente criação da Comissão Nacional da Verdade da Escravidão Negra no Brasil, mas lembrou que ainda é baixa a representação dessa parte da sociedade em outros postos do Judiciário, além de terem dificuldade de arcar com custos ao longo da profissão. Sugeriu a criação de parcerias para o estímulo nos estudos e na carreira para advogados jovens e negros.

COMPROMISSO INTERNACIONAL

Wilson Prudente, promotor do trabalho e membro da Comissão Nacional da Verdade da Escravidão Negra no Brasil, trouxe em sua palestra um panorama internacional da promoção da igualdade racial e combate ao racismo. Após duas Guerras Mundiais, relembrou, consagrou-se os princípios dos direitos humanos como elemento de civilização. “A dignidade da pessoa humana foi elevada à condição de axioma. O único valor absoluto da civilização veio a ser o princípio da dignidade da pessoa humana, do qual decorre todo o ordenamento jurídico.”

A partir daquele momento, segundo Prudente, começou-se a escrever uma civilização na qual racismo não tenha cerco. “O primeiro grande documento é a Declaração Universal dos Direitos Humanos”, afirmou. “Mais tarde houve necessidade de que a ONU criasse convenção própria para eliminação de todas as formas de discriminação racial, em 1995. O texto consagrou o princípio de que as políticas adotadas para promover minorias não seriam consideradas discriminatórias”, afirmou.

“Racismo, quando praticado em larga escala, é crime contra a humanidade. A Declaração de Durban é expressa: a escravidão negra e o tráfico transatlântico de pessoas são crimes contra a humanidade, então são estão submetidos aos critérios de prescrição. Ou o regime internacional de combate ao racismo se torna efetivo ou se efetivará a barbárie”, afirmou. “Recentemente, a OEA aprovou o documento internacional mais progressista e completo, a Convenção Interamericana Contra o Racismo, Discriminação Racial e Intolerância Conexas e Correlatas. Brasil tem que subscrever esse documento”, cobrou.

Nilma Lino Gomes, ministra da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República, apresentou questões sobre como a promoção da igualdade adensa a discussão sobre direitos humanos. Segundo a ministra, o processo passar por mostrar à sociedade que a pauta dos direitos humanos não são um grande guarda-chuva no qual se protegem as diferenças.

“No caso da população negra, soma-se a luta contra o racismo pela dos direitos humanos e nos faz refletir sobre a realidade tensa e complexa, uma história marcada por várias desigualdades. Após 515 anos de colonização, estamos ainda colhendo frutos da herança ancestral de descendentes de africanos trazidos ao Brasil. Para se tornar cada vez mais humanos, é preciso uma luta incisiva não apenas da população negra, mas de todos que querem construir democracia”, explicou.

Segundo Nilme, a questão da humanidade também precisa ser problematizada, em matizes como gênero e região. Também é fundamental a reeducação das relações sociais e o rompimento da lógica da homogeneidade. “A pátria deve se preocupar com os jovens. Nesse sentido, não podemos reduzir a maioridade penal, por exemplo. A superação do racismo é deve de Estado, é preciso entender que o Brasil é um país diverso”, finalizou.

Nenhum comentário:

Postar um comentário