quinta-feira, 2 de abril de 2009

JOVENS ADVOGADOS DO BB NÃO PODERÃO SER DESCOMISSIONADOS POR AUSÊNCIA DE CERTIFICAÇÃO

Os Advogados do Banco do Brasil estão há comemorar a sentença do Juiz do Trabalho da 15 Vara do Trabalho de Brasília, Dr. CRISTIANO SIQUEIRA DE ABREU E LIMA, que impediu que os mesmos sejam revertidos ao cargo administrativo, a bel prazer do patrão, por ausência de serôdia prova de certificação. Parabéns á CONFEDERAÇÃO NACIONAL DOS TRABALHADORES NAS EMPRESAS DE CRÉDITO - CONTEC. Eis a sentença do magistrado.

Processo n1 01191-2008-015-10-00-7

PROCESSO:

01191-2008-015-10-00-7

AUTOR:

CONFEDERAÇÃO NACIONAL DOS TRABALHADORES NAS EMPRESAS DE CRÉDITO - CONTEC

Advogado:

Ricardo Quintas Carneiro

RÉU:

BANCO DO BRASIL S.A.

Advogado:

Marco Aurélio Aguiar Barreto

ATA DE AUDIÊNCIA

Aos 31 dias do mês de março de 2009, na sala de sessões da Eg. 15ª Vara do Trabalho de Brasília - DF, sob a direção do Exmo. Juiz do Trabalho Substituto CRISTIANO SIQUEIRA DE ABREU E LIMA, realizou-se a audiência referente ao processo em epígrafe.

A audiência teve início às 17h55min, momento em que foram apregoadas as partes.

Ausentes, foi proferida a seguinte

S E N T E N Ç A

I - RELATÓRIO

Vistos e examinados os autos.

CONFEDERAÇÃO NACIONAL DOS TRABALHADORES NAS EMPRESAS DE CRÉDITO - CONTEC ajuizou ação civil pública (fls. 2/36), com documentos de fls. 37/411, em desfavor do BANCO DO BRASIL S.A., alegando que, após a edição do Regulamento de Certificação para Analista Jurídico “C”, o banco, sem a devida e necessária observância dos procedimentos internos anteriormente prescritos, passou a convocar os advogados integrantes de seu quadro jurídico, ascendidos à função de Analista Jurídico “C”, para que fossem submetidos a novo processo de seleção, sob a ameaça de serem destituídos de suas comissões, em caso de não participação ou reprovação. Por tais motivos, requereu que (i) fosse declarada a impossibilidade de o processo de certificação interna para Analista Jurídico “C” produzir quaisquer efeitos em relação aos advogados já integrantes do quadro jurídico, para fins de descomissionamento, de modo que a este somente se perfaça através das hipóteses do Livro de Instruções Certificadas; e (ii) absteve-se de rescindir a título de retaliação os contratos de trabalho dos advogados convocados a participar da certificação. Atribuiu à causa o valor de 20.000,00.

Devidamente notificadas, as partes compareceram à audiência inaugural (fl. 252), restando infrutífera a primeira tentativa conciliatória.

Em seguida, o Reclamado apresentou contestação escrita (fls. 257/289), acompanhada dos documentos de fls. 290/518, argüindo preliminares de litispendência e continência, bem como defendendo o processo de certificação interna.

Sobre a contestação e os documentos apresentados pelo Reclamado, o Reclamante apresentou manifestação a fls. 421/524.

Na audiência de instrução (fl. 525), foi ouvido o Reclamado.

Parecer do D. Ministério Público às fls. 527/542.

Na audiência de fl. 544, foi encerrada a instrução processual, sendo realizadas razões finais orais remissivas e restando rejeitada a última tentativa conciliatória.

É o relatório.

II - FUNDAMENTOS

1. LITISPENDÊNCIA

Na dicção do artigo 301, §1º, do CPC, “verifica-se a litispendência ou a coisa julgada, quando se reproduz ação anteriormente ajuizada”. Por sua vez, a luz do artigo 301, §2º, do CPC, “uma ação é idêntica à outra quando tem as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido”. Finalmente, o artigo 301, §3º, do CPC preceitua que “há litispendência, quando se repete ação, que está em curso; há coisa julgada, quando se repete ação que já foi decidida por sentença, de que não caiba recurso”.

In casu, não há que se falar em litispendência entre a presente ação e a de nº 00919-2008-009-10-00-1, pois as partes autoras não são as mesmas (CPC, art. 301, §2º), na medida em que essa última foi ajuizada pela Federal Nacional dos Advogados, ao passo que a submetida a este juízo foi apresenta pela CONTEC.

Como se não bastasse, conforme constatado no parecer feito pelo d. Ministério Público do Trabalho, a decisão que extinguiu o processo sem resolução de mérito, proferida nos autos da ação nº 00919-2008-009-10-00-1, já transitou em julgado em 07.01.2009, razão por que, não havendo processo pendente, não há que se falar em litispendência (CPC, art. 301, §3º).

Por tais motivos, rejeito a preliminar.

2. REUNIÃO DOS PROCESSOS POR CONTINÊNCIA

Não fosse o suficiente inexistir identidade de partes, já que os Autores das ações confrontadas são diferentes, não há que se falar em reunião de processos, quando um deles já se encontra extinto.

Ora, a reunião dos processos é uma faculdade do juiz para possibilitar o julgamento simultâneo de ações similares, caracterizadas por conexão ou continência (CPC, art. 105), em prestígio à segurança jurídica, celeridade e economia processual. Entretanto, se uma das ações já transitou em julgado, a reunião se torna inviável, pois não será possível, por óbvio, julgá-las simultaneamente.

Por tais motivos, rejeito o requerimento.

3. LEGALIDADE DO PROCESSO DE CERTIFICAÇÃO

Em seu parecer, o d. Ministério Público do Trabalho opinou pela improcedência dos pedidos da ação ao fundamento de que “o bem jurídico cuja tutela é buscada pelos substituídos não lhes pode ser estendido”, uma vez que “os mesmos sequer possuem o alegado direito adquirido a sua manutenção à frente dos postos comissionados que atualmente ocupam” (fl. 537).

De fato, conforme exposto no aludido parecer do representante do Ministério Público do Trabalho, comungo do entendimento de que os substituídos não fazem jus à permanência na “posição” de ANALISTA JURÍDICO “C”, antigamente conhecida como de ADVOGADO JÚNIOR.

Ora, consoante indicado pelo d. Ministério Público do Trabalho, “deduz-se das informações contidas nos autos que o preenchimento dos cargos de natureza jurídica não se dá por meio de concurso público específico para tal área” (fl. 537). Na verdade, pela análise da contestação (fl. 271), infere-se que os bancários ascendem à condição de advogado por meio de livre nomeação do Reclamado, o que a meu ver viola o artigo 37, inciso II, da Carta Magna, conforme já tive oportunidade de me manifestar nos autos da ação civil pública nº 00128-2007-014-010-00-6.

É imprescindível retomarmos os fundamentos que abrigam a exigência de prévia aprovação em concurso público nos quadros da Administração Pública, bem como a evolução histórica da previsão constitucional da referida obrigação. Afinal, para compreender o presente, é imprescindível, por primeiro, conhecer o passado. Cícero sabiamente já ensinava que “a história é a testemunha dos tempos, a luz da verdade, a vida da memória, a mestra da vida, a mensageira da Antigüidade” (historia vero testis temporum, lux veritatis, vita memoriae, magistra vitae, nuntia vetustatis) (CÍCERO, De oratore, liv. II, cap. 9, par. 36.). Reverberando os ensinamentos do pensador italiano, Manuel Alonso Olea dizia que “provavelmente não existe instituição jurídica inteiramente inteligível sem uma exposição histórica de sua origem e desenvolvimento, pois ambos em grande parte predeterminam a forma como aparece estruturada no momento em que se faz o estudo e dão razão a seus caracteres e suas peculiaridades”.

Vários são os fundamentos que justificam a obrigatoriedade de realização de concurso público para a investidura em cargo ou emprego público, aqui sintetizados em três postulados apresentados por José dos Santos Carvalho Filho:

Baseia-se o concurso público em três postulados fundamentais. O primeiro é o princípio da igualdade, pelo qual se permite que todos os interessados em ingressar no serviço público disputem a vaga em condições idênticas para todos. Depois, o princípio da moralidade administrativa, indicativo de que o concurso veda favorecimentos e perseguições pessoais, bem como situações de nepotismo, em ordem a demonstrar que o real escopo da Administração é o de selecionar os melhores candidatos. Por fim, o princípio da competição, que significa que os candidatos participam de um certame, procurando alçar-se a classificação, que significa que os candidatos participam de um certame, procurando alçar-se a classificação que os coloque em condições de ingressar no serviço público. (Manual de direito administrativo. 17ª edição. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007, p. 541)

De fato, o concurso público representa mecanismo de transparência, igualdade, impessoalidade e moralidade no acesso a cargo ou emprego público, pois, além de permitir a participação a de qualquer interessado legalmente legitimado (brasileiro nato ou naturalizado, assim como, na forma de lei, estrangeiros – CF, art. 37, I), a investidura depende de fatores objetivos, escolhidos de acordo com a natureza e a complexidade do cargo, estabelecidos no edital do certame e exigidos nas provas de conhecimento e de títulos, coibindo, dessa maneira, a um só tempo, favorecimentos aos “amigos do rei” (proximidade, nepotismo, favorecimento eleitoreiro e/ou político etc) e perseguições pessoais (inimizade, perseguição política, discriminações de raça, idade sexo etc).

Ademais, o “concurso público é o instrumento que melhor representa o sistema de mérito, porque traduz um certame de que todos podem participar nas mesmas condições, permitindo que sejam escolhidos realmente os melhores candidatos” (CARVALHO FILHO, José dos Santos. op cit, p. 541). Ora, ao se traduzir em procedimento administrativo que tem por fim encontrar a melhor relação de adequação entre as aptidões pessoais de cada candidato e as exigências, natureza e condições do cargo ou emprego público almejado, o concurso público acaba por constituir instrumento de identificação dos melhores candidatos à vaga garantidora do acesso aos quadros da Administração Pública, em inequívoco benefício à eficiência administrativa. Bem pondera João Batista Gomes Moreira quando reflete que, “ao lado dos interesses individuais dos candidatos em concurso está o interesse da sociedade por uma administração eficiente”, já que, “como o processo de licitação, o de concurso destina-se a preservar a igualdade entre os candidatos, mas, ao mesmo tempo, à obtenção de recursos humanos qualitativamente adequados à missão de serviço público” (Princípios Constitucionais da Legalidade e Eficiência nos Concursos Públicos. Concurso Público e Constituição. Coordenador: Fabrício Motta. Belo Horizonte: Fórum, 2005, p. 130).

Como se não bastasse, a exigência do concurso público, por vias indiretas, assegura a continuidade na prestação dos serviços, afastando o sistema de despojos (spoil’s system) em razão da constituição de um corpo permanente na Administração Pública, integrado por servidores concursados, imunes a substituições casuísticas a cada mudança de governo, o que evita, conforme adverte Manoel Gonçalves Ferreira Filho, nefastos inconvenientes ao interesse público:

gerava inconvenientes graves, quais a instabilidade administrativa, as interrupções no serviço, a descontinuidade nas tarefas, e não podia ser mantido no Welfare State, cujo funcionamento implica a existência de um corpo administrativo capaz, especializado e treinado, à altura de suas múltiplas tarefas. (APÚD MORAES, Alexandre de. op cit. p. 824)

Apresentados, em síntese apertada, os fundamentos que sustentam a exigibilidade do concurso público, passo, nesse momento, a passear pela evolução histórica da previsão constitucional do aludido instituto, com o propósito de buscar elementos que esclareçam a viabilidade ou a proibição da designação de escriturários para a função de advogados em sociedade de economia mista1.

Denerson Dias Rosas, em seu artigo “O concurso público como princípio constitucional e a promoção interna na carreira” relata o contexto do desempenho de funções públicas na época do Império brasileiro:

Durante a época do Brasil Império, o desempenho de funções públicas dava-se por meio de delegação, direta ou indireta, do Imperador. Tinha-se tão somente o exercício de cargos sob a modalidade “em confiança”, podendo o Imperador admitir ou exonerar funcionários públicos quando julgasse conveniente.

Esta situação fundamentava-se na presunção de que a vontade do Imperador confundia-se com a vontade do próprio Estado e, consequentemente, com a vontade e interesse coletivo. (L&C: Revista de Direito e Administração Pública, v. 8, n. 83, p. 7, maio, 2005)

A despeito disso, já se percebia na Constituição Política do Império do Brasil (1824), em seu artigo 179, XIV, a preocupação de livre acesso à investidura pública, sem discriminações de qualquer natureza:

Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Políticos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Império, pela maneira seguinte.

(…)

XIV. Todo o cidadão pode ser admitido aos cargos públicos civis, políticos ou militares, sem outra diferença, que não seja a dos seus talentos, e virtudes.

No artigo 73 da Constituição da República de 1891, apesar de mantido o sistema discricionário de escolha de servidores públicos, foi vedada a acumulação de recebimento de proventos no exercício de mais de uma função pública:

Art. 73. Os cargos públicos civis ou militares são acessíveis a todos os brasileiros, observadas as condições de capacidade especial que a lei estatuir, sendo, porém, vedadas as acumulações remuneradas.

O artigo 170, §2º, da Carta Magna de 1934, foi o primeiro a instituir a exigência de concurso público, ressaltando a importância da moralidade na escolha dos servidores públicos pela necessidade de instrumentos imparciais para o provimento o provimento de cargos públicos:

Art. 170. O Poder Legislativo votará o Estatuto dos Funcionários Públicos, obedecendo às seguintes normas, desde já em vigor:

(...)

2º) a primeira investidura nos postos de carreira das repartições administrativas, e nos demais que a lei determinar, efetuar-se-á depois de exame de sanidade e concurso de provas ou títulos;

Infere-se que, ao estabelecer a exigência do concurso público, o constituinte da “Era Vargas” apenas o fez em relação à primeira investidura no cargo, nada se referindo às ascensões funcionais.

Mantida a exigência de concurso público na Constituição de 1937 em relação à primeira investidura do cargo:

Art. 156. O Poder Legislativo organizará o Estatuto dos Funcionários Públicos, obedecendo aos seguintes preceitos desde já em vigor:

(...)

b) a primeira investidura nos cargos de carreira far-se-á mediante concurso de provas ou de títulos

Proposição similar foi repetida no artigo 186 da Constituição de 1946:

Art. 186. A primeira investidura em cargo de carreira e em outros que a lei determinar efetuar-se-á mediante concurso, precedendo inspeção de saúde.

Apenas, a partir da Carta Magna de 1967, o concurso público passou a ser obrigatório para o provimento de todos os cargos públicos, exceto os cargos em comissão:

Art. 95. Os cargos públicos são acessíveis a todos os brasileiros, preenchidos os requisitos que a lei estabelecer.

§ 1º. A nomeação para cargo público exige aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos.

§ 2º. Prescinde de concurso a nomeação para cargos em comissão, declarados em lei, de livre nomeação e exoneração.

A inovação apresentada dois anos antes foi desprestigiada Na Constituição de 1969, retornando-se à exigência de concurso público tão-somente em relação à primeira investidura:

Art. 97. Os cargos públicos serão acessíveis a todos os brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei.

§ 1° A primeira investidura em cargo público dependerá de aprovação prévia, em concurso público de provas e títulos, salvo os casos indicados em lei.

§ 2° Prescindirá de concurso a nomeação para cargos em comissão, declarados em lei, de livre nomeação e exoneração.

Finalmente, na redação do artigo 37, inciso II, da Constituição da República de 1988, não mais se observa a referência à primeira investidura, tampouco à vinculação apenas a cargo público, razão por que se conclui que a realização de concurso público, a partir da nova ordem constituição, é obrigatória para qualquer cargo público (salvo os em comissão, de livre nomeação e exoneração ad nutum) ou emprego público, sendo vedada a ascensão funcional que provoque a mudança de carreira:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

I. os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei;

II. a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;

Conforme bem lembrado por Bento Herculano Duarte, “o acesso ao serviço público tem preocupado, desde há muito, o legislador constituinte pátrio” (Contratação de servidores públicos ao arrepio do art. 37, II, da CF. Efeitos da Nulidade. Trabalho & Doutrina: Processo Jurisprudência, n. 14, p. 143-148, set., 1997, p 144). A evolução histórica permite traçar cenário em que a livre escolha de servidores públicos pelo Imperador progrediu, em um primeiro momento, para a exigência de instrumento imparcial de concorrência entre os candidatos à primeira investidura a cargo público (CF de 1934), avançando para a exigência de concurso público para cada cargo e emprego público, considerado individualmente.

Realmente, o cotejo entre as redações dos artigos 97, §1º, da Carta de 1969 e 37, inciso II, da Constituição da República de 1988, promovido na leitura de Maria Sylvia Zanella Di Pietro, é esclarecedor quanto ao tema:

O dispositivo trouxe algumas inovações quando comparado com o artigo 97, §1º, da Constituição de 1967:

1. enquanto a norma anterior exigia concurso apenas para investidura em cargo público, a atual impõe a mesma exigência para cargo e emprego; só não faz referência a função, porque deixou em aberto a possibilidade de contratação para serviços temporários (art. 37, IX) e para funções de confiança (art. 37, V), ambas as hipóteses sem concurso;

2. enquanto o dispositivo anterior fazia a exigência para a primeira investidura, o atual fala apenas em investidura, o que inclui tanto os provimentos originários como os derivados, somente sendo admissíveis as exceções previstas na própria Constituição (...).

(Direito administrativo. 12ª edição. São Paulo: Atlas, 2000, p. 465)

Consoante consignado no acórdão do Excelso Supremo Tribunal Federal da lavra do E. Ministro Paulo Brossard, nos autos da ADI nº 242/RJ (in DJ de 23.3.01), “o §1º do artigo 97 da Carta de 1969 exigia concurso público para a ‘primeira investidura’ no serviço público, e não para cargo inicial de carreira, além de ressalvar outros casos indicados em lei; permitia, pois, o provimento derivado de cargos públicos pelo acesso, transferência, aproveitamento e progressão funcional”. Sucede que “o artigo 37, inciso II, da Constituição exige concurso público para investidura em qualquer cargo público, salvo para os cargos em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração e para os cargos subseqüentes da carreira, cuja investidura se faz pela forma de provimento denominada ‘promoção’”, não permitindo “o provimento por ascensão ou acesso, transferência e aproveitamento de servidor em cargos ou empregos públicos de outra carreira, diversa daquela para a qual prestou concurso público”.

No mesmo sentido decidiu o Excelso Supremo Tribunal Federal, em acórdão da lavra do E. Ministro Moreira Alves, nos autos da ADI nº 231, que, ao tratar do artigo 37, inciso II, da Constituição da República, reputou banida qualquer forma de ingresso em carreira diversa daquela para o qual o servidor público ingressou por concurso.

Este Tribunal Regional do Trabalho já teve também a oportunidade de se manifestar sobre o tema, em acórdão da lavra do E. Juiz do Trabalho Mário Macedo Fernandes Caron:

3. PROVIMENTO DERIVADO DE CARGO OU EMPREGO PÚBLICO. EXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO. Entendimentos doutrinários a respeito da interpretação de texto constitucional, por mais respeitáveis que sejam, não têm o condão de afastar a incidência de norma inscrita na Constituição mormente quando, à época em que praticados os atos ora impugnados, a interpretação conferida pelos Tribunais ao inciso II do art. 37 da CF/88 já apontava majoritariamente para o entendimento de que a norma instituiu exigência de concurso público também para o provimento derivado de cargos e empregos no serviço público. (TRT 10ª Região, 2ª Turma, 01361-1998-005-10-85-6, in DJU de 21.5.2004)

Portanto, a evolução histórica da exigência de concurso público nos textos constitucionais da República Federativa do Brasil, associada aos fundamentos que alicerçam o referido instituto jurídico de acesso ao serviço público, autoriza concluir que é proibida a mudança do servidor público, celetista ou estatutário, para outra carreira, sem realização de novo concurso público, específico para as novas atribuições. Em outras palavras, não é permitida, mesmo para aqueles servidores já aprovados em concurso público para determinado cargo ou emprego, a mudança para outra carreira, sem a realização de novo concurso, de livre acesso a qualquer interessado legalmente autorizado ao acesso público e não apenas aos já ingressos na Administração Pública.

O constituinte de 1988, consciente dos inconvenientes gerados por ascensões e transferências de servidores para carreiras diversas daquela originariamente ocupada, pretendeu, de forma explícita, ao excluir a referência ao primeiro ingresso, evidenciar a importância da correlação e da pertinência entre o concurso realizado e o cargo ou emprego almejado. Afinal, o objetivo do concurso é escolher, mediante a participação de todos os interessados autorizados por lei (CF, art. 37, I), por meio de critérios objetivos, os melhores candidatos ao desempenho das funções públicas, em observância aos princípios da isonomia, moralidade e eficiência.

A mudança para carreira, cujas atribuições não guardam relação com aquelas atividades do posto em que originariamente houve a aprovação em concurso público, frustra tal objetivo, pois ofende, não apenas o direito de livre acesso a cargos e empregos públicos daqueles que ainda não ingressaram nos quadros da Administração Pública (CF, art. 37, I), mas também a impessoalidade e a moralidade administrativa, pois esse procedimento pode propiciar, independentemente do mérito do servidor já aprovado em concurso diverso, seu favorecimento injustificado, motivado por diversas causas subjetivas, podendo ser escolhido não o melhor candidato para a vaga, mas aquele que, por afinidades pessoais, políticas, religiosas e corporativas, tenha a preferência de quem tem a competência para designar a nefasta transferência, em franco prejuízo à eficiência administrativa. Aliás, torna-se evidente a fragilidade da tese do Réu de que obrigatória apenas a aprovação em concurso público para o “primeiro” emprego público, pois, se fosse assim, seria legítimo, segundo os fundamentos por ele apresentados, a designação imediata, por simples decisão da autoridade competente, motivada por afinidade pessoal, de um servidor, aprovado em concurso promovido por empresa pública, cuja condição de participação e admissão era apenas a conclusão do ensino fundamental, para a função de advogado, com majoração expressiva do salário. A bem corroborar o esposado, Celso Antônio Bandeira de Mello esclarece que o artigo 37, inciso II, da Constituição da Republica buscou “impedir tanto o ingresso sem concurso, ressalvadas as exceções previstas na Constituição, quanto obstar a que o servidor habilitado por concurso para cargo ou emprego de determinada natureza viesse depois a ser agraciado com cargo ou emprego permanente de outra natureza, pois esta seria forma de fraudar a razão de ser do concurso publico” (Curso de direito administrativo. 15ª ed. São Paulo: Melhoramentos, 2003, p. 257).

Ademais, em um esforço de reflexão, mesmo que admitida, por hipótese, a premissa de que possível a mudança de carreira, haveria o inconveniente de restar ressuscitado, como em assombração, o censurável sistema de despojo (spoil’s system), já que, se seria possível a transferência para cargo ou emprego diferente daquele em que foi prestado o concurso público primário, igualmente, pelos mesmos motivos, não se poderia negar a recondução ao estágio anterior, por decisão exclusiva do Administrador, quando da mudança de direção de determinado órgão público.

Não se defende aqui a extinção de todas as formas de progressão dentro da carreira ou de provimentos derivados, pois o artigo 37, inciso II, da Constituição da República não proibiu a figura da “promoção”, tampouco a organização dos cargos em carreira, vedando apenas a mudança de servidores públicos para outras carreiras, sem realização de concurso público correspondente, conforme se depreende novamente de Celso Antônio Bandeira de Mello:

a exigência de formas de provimento derivadas, de modo algum significa abertura para costear-se o sentido próprio do concurso público. Como este é sempre específico, para dado cargo¸ inserto em carreira certa, quem nele se investiu não pode depois, sem novo concurso público, ser transladado para cargo de carreira diversa ou de outra carreira melhor redistribuída ou de encargos mais nobres ou elevados.

O nefando expediente a que se alude foi algumas vezes adotado, no passado, sob a escusa de corrigir-se desvio de funções ou com arrimo na nomenclatura esdrúxula de ‘transposição de cargos’. Corresponde a uma burla manifesta do concurso público. É o que permite que candidatos singelos, destinados a cargos outros, para cujo ingresso se demandaria sucesso em concurso de dificuldades muito maiores, disputados por concorrentes de qualificações bem mais elevadas. (Regime constitucional dos servidores da administração direta e indireta, RT, 1990, p. 45).

Ecoando o mesmo coro, Dênerson Dias Rosa:

Quando o legislador constituinte decidiu estatuir que a investidura em cargos públicos depende de aprovação prévia em concurso público, não pretendeu este extinguir o mecanismo de promoção como crescimento funcional dentro de uma carreira, mas, como perfeitamente aclarado na Emenda Supressiva nº 2T00736-1, simplesmente impedir que pudessem, no serviço público, ocorrer situações de servidores, concursados para cargos de determinadas carreiras, sendo realocados para cargos integrantes de outras carreiras. Buscou o legislador constituinte impedir que houvesse a possibilidade de servidores serem admitidos para carreiras com mínimas exigências profissionais e depois aproveitados em cargos especializados.

Para dirimir ainda qualquer possibilidade de controvérsia, importante frisar que o legislador constituinte não quis acabar com a carreira, mas sim, tal como consta da Emenda Supressiva nº 2T00736-1, garantir que o servidor aprovado em concurso público para determinada carreira pudesse ser promovido apenas dentro dessa carreira. Claramente exposto que se fundamentou em que “o Texto, da forma como se encontra redigido, permite o ingresso no serviço público através de um concurso público para carreiras cujas exigências de qualificação profissional sejam mínimas como mero trampolim para, por mecanismos internos muitas vezes escusos, se atingir cargos mais especializados”. (op. cit, p. 10 e 11)

De todo o exposto, conclui-se que a transferência, mudança, transposição ou ascensão que implique o desempenho por servidor público de atividades típicas de carreira diversa à originária, ou seja, estranhas ao cargo ou emprego público para o qual foi aprovado em concurso público, ofende o artigo 37, caput, incisos I e II, da Carta Magna.

Resta investigar, portanto, se a designação de escriturários para o desempenho de atividades específicas de advogado importa em mudança de carreira.

Segundo Hely Lopes Meirelles carreira “é o agrupamento de classes2 da mesma profissão ou atividade, escalonadas segundo a hierarquia do serviço, para acesso privativo dos titulares dos cargos que a integram, mediante provimento originário” (Direito administrativo brasileiro. 25ª ed. São Paulo: Melhoramentos, 2000. p. 381).

Nesse sentir, percebe-se que a função de advogado não pode ser organizada dentro da carreira de escriturário, uma vez que são profissões distintas, com naturezas, complexidades e exigências diversas. Somente podem ser organizadas em carreira as funções que, em razão das habilidades e conhecimentos exigidos no concurso público, poderiam, em tese, ser desempenhadas pelo candidato, desde o início da investidura em cargo público ou a admissão em emprego público. O fator que deve nortear a promoção para cada nível ou função, dentro de uma mesma carreira, precisa se fundar em critérios de antiguidade e experiência e não em requisitos, conhecimentos e habilidades que não foram exigidos no concurso público. Assim, as profissões que exigem qualificação especial para o exercício da atividade laboral, sem a qual a respectiva atividade laboral é proibida (CF, art. 5º, XIII), a saber, medicina, odontologia, advocacia, engenharia, entre outras, não podem integrar a carreira de escriturário, pois somente podem ser reunidas em um mesmo agrupamento de classes as atividades que, em tese, poderiam ser exercidas por qualquer profissional daquela carreira, dada a inexistência de habilitação especial para a execução dos serviços.

Entretanto, ao contrário do que foi sugerido pelo d. Ministério Público do Trabalho, entendo que o fato de inexistir concurso público externo específico para o empregado de advogado do Banco do Brasil não permite que se pratique, com base em processo de certificação interna, não existente no momento da ascensão à posição de advogado, a reversão unilateral de quem ocupa a condição de ANALISTA JURÍDICO “C”.

No meu entender, a reversão dos analistas jurídicos “C” ao cargo efetivo de escriturário somente seria legítima, à luz da teoria dos motivos determinantes, se baseada na ausência de prévia aprovação em concurso público (externo e não interno) para o emprego específico de advogado ou se referendada em normas internas legítimas, existentes antes da ascensão à posição, cuja reversão se quer impedir. Ora, o fundamentado apresentado para descomissionar os analistas “C” deve ser legítimo, o que não se verifica, a meu ver, na presente hipótese, pois inexistente, no momento da ascensão, norma interna que permitisse a avaliação posterior do advogado, por meio de concurso, para sua manutenção na função. De fato, as normas do Livro de Instruções Codificados, citadas às fls. 271/272, não autorizam a realização de concurso de provas após a ocupação da posição de advogado júnior. Como se não bastasse, além de provas de conhecimentos, os advogados seriam submetidos à avaliação técnico-comportamental, em caráter eliminatório (fls. 146/160). A subjetividade de tal processo de certificação poderia gerar discussões sobre perseguições pessoais a determinados empregados que já exercem a posição de analista jurídico “C”, em conduta incompatível com a transparência que deve ser reclamada à Administração Pública.

A tese de que o processo de certificação seria exigido apenas para aqueles empregados ascendidos à Analistas Jurídicos “C” sem aprovação em concurso interno (fl. 273) ou que tal procedimento, na verdade, visava cumprir a exigência de comissionamento mediante processo seletivo não merece prevalecer. Afinal, o LIC 460.050.02.1825 estabelece aprovação em processo de concorrência interna como requisito para o comissionamento, o que poderia ser atendido por meio da avaliação curricular ou realização de entrevistas e não necessariamente através de provas de conhecimento técnico e de natureza comportamental. Assim, o fato de não ter participado de concurso de provas para acesso à posição de advogado, não autoriza, pelos normativos internos vigentes no momento da promoção, a realização após essa para aqueles que foram selecionados, entre vários pretendentes, mediante análise curricular ou por meio de entrevistas.

Por outro lado, o fato de o empregado colocar seu tempo à disposição do empregador por força do vínculo empregatício não significa reconhecer que o empregador, no exercício do poder diretivo, poderá submeter seus empregados a qualquer tipo de situação ou poderá exigir o cumprimento de qualquer tipo de atividade laboral. É desnecessário assinalar que o poder diretivo, ao contrário do que quer fazer crer o Reclamado, encontra-se seus limites no plexo de regras, princípios e instituições que alicerçam o Direito do Trabalho, razão por que seu exercício não se legitima quando exercido de forma contrária aos ditames legais.

Esclareço que o presente entendimento não ofende o artigo 173, §1º, inciso II, da Constituição Federal, pois, em nenhum momento, referenda-se qualquer medida que atente contra a sujeição do Reclamado ao regime celetista. Muito pelo contrário, os fundamentos que deram sustento ao presente entendimento são todos baseados na impossibilidade de alteração de condições de trabalho anteriormente asseguradas aos analistas jurídicos “C”.

De igual forma, não se pode concluir pela violação ao artigo 468, parágrafo único, da CLT, pois, salvo melhor juízo, o exercício de emprego público de advogado não é função que pode ser comissionada ou descomissionada pela simples vontade do empregador. A reversão dos analistas jurídicos “C” ao cargo efetivo de escriturário, conforme já mencionado, somente seria legítima, à luz da teoria dos motivos determinantes, se baseada na ausência de prévia aprovação em concurso público (externo e não interno) para o emprego específico de advogado, o que não ocorreu na presente hipótese.

Não há que se falar ainda que a presente decisão confere aos analistas “C” estabilidade indireta na função. Na verdade, sem impedir a reversão de todos que se encontram na posição de Analista Jurídico “C”, a decisão apenas condena o meio utilizado pelo Reclamado para tal fim: processo de certificação interna não previsto anteriormente.

Por tais motivos, defiro parcialmente o pedido “c” da exordial para impedir o descomissionamento ou a dispensa de Analistas Jurídicos “C” com base no referido processo de certificação superveniente, discutido nos autos (fls. 146/160).

4. REQUERIMENTO PARA RISCAR AS AFIRMAÇÕES INJURIOSAS

Não vislumbro a adoção de afirmações injuriosas nos quatro primeiros parágrafos do item IV (Dos Fatos) da inicial (fls. 8/9), pelo que indefiro o requerimento de riscá-las.

5. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ

A ausência de litispendência e de continência conduz à ilação de que a Autora não adotou qualquer conduta processual que pudesse enquadrá-la na condição de litigante de má-fé (CPC, arts. 14 e 17).

Por tais motivos, indefiro.

6. HONORÁRIOS ASSISTENCIAIS

A Autora não é beneficiária da Justiça Gratuita, não podendo ser considerada hipossuficiente sob o critério econômico-jurídico, pelo que indefiro o pedido “f”.

Pelos mesmos motivos, reputo não preenchidos os requisitos do artigo 14, §1º, da Lei nº 5.584/70, na leitura promovida pelas Súmulas 219 e 329 do TST, razão por que indefiro o pedido de honorários advocatícios.

III - CONCLUSÃO

Ante o exposto, REJEITO as preliminares e JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos da reclamação trabalhista ajuizada por CONFEDERAÇÃO NACIONAL DOS TRABALHADORES NAS EMPRESAS DE CRÉDITO - CONTEC para determinar que o BANCO DO BRASIL S.A. abstenha de descomissionar ou dispensar os que ocupam a posição de Analistas Jurídicos “C” com base no processo de certificação interna superveniente (fls. 146/160).

Custas, pelo Reclamado, no importe de R$400,00, calculadas sobre o valor arbitrado à causa (R$20.000,00).

Intimem-se as partes e o d. Ministério Público do Trabalho.

Encerrada às 17h56min.

CRISTIANO SIQUEIRA DE ABREU E LIMA

Juiz do Trabalho Substituto

1 Dispositivos constitucionais transcritos da base de dados do sítio eletrônico www.planalto.gov.br

2 Hely Lopes Meirelles ensina que classe “é o agrupamento de cargos da mesma profissão, e com idênticas atribuições, responsabilidade e vencimentos”, constituindo os degraus de acesso na carreira.

14

Nenhum comentário:

Postar um comentário